Usualmente o bom que têm as novas televisivas é que passam num período de tempo no que geralmente as imagens e as palavras não dão associado no nosso cérebro. Por isso, as mais das vezes, a força da noticia está na sua repetição nas diversas edições, para fazer chegar a mensagem aos recetores passivos dessa nova chaminé dos nossos lares que é a TV.
Assim, há uns poucos dias, em pouco menos de trinta segundos, saiu em todos os nossos ecrãs a noticia de que o governo da República Popular da China, vinha de implantar um mecanismo tecnológico de reconhecimento facial e que a través de um algoritmo é capaz de dar uma nota de «bom» ou «mau» cidadão. Uma espécie de «social credit»; de credito social; em base não unicamente a uma invasão da tua privacidade a través do controlo da Internet do governo chinês, para já também uma monitorização dos teus comportamentos na vida real, com este algoritmo que permite situar e realizar um seguimento real da tua vida. Com a cumplicidade de milhões de càmaras de vídeo situadas estrategicamente nas diversas macro-urbes, o governo chinês pode pontuar aos seus cidadãos a través do seu seguimento na vida quotidiana.
Isto para qualquer pessoa do campo da investigação na sociologia tem grandes implicações, na estrutura do que até o dia de hoje foram as cidades contemporàneas. O esquema que muitos chamam «desatenção civil» era o que organizava de algum jeito as relações nas grandes cidades. Isto quer dizer, esse «laissez faire» onde os uns não olhamos para os outros nas grandes concentrações humanas, essa «desatenção civil» que olhamos sempre que há um crime e a vizinhança comenta do presunto homicida, parricida, ladrão,.. «Era um tipo normal». Essa «desatenção civil» que conseguiu também criar redes de apoio e coletivos sociais múltiplos e diversos e, por acaso, levou ao surgimento das ONG`S e às mais das manifestações culturais urbanas do nosso tempo, desde os grafites ao rap ou o hip-hop como fenómenos globais urbanos.
Podemos ficar a olhar um cambio fundamental nas construções sociais tal e como até o de agora as entendemos. O caminho começado na China abre a porta a uma distopia totalitária nas nossas vidas. Neste caminho o neo-confucionismo e o neo-tradicionalismo vão da mão para cimentar a paz social e a estabilidade necessária para levar adiante o Xiismo. Agora o governo chinês vai dar a cada cidadão uma marca que valora a confiabilidade para com o seu governo e, pegado a isto, a virtude que demonstra como cidadão. Sobre esta marca, em forma de índice, em forma de «sincerity score», é que serão outorgadas liberdades e cedidos privilégios.
Pode ser o começo de uma nova era na vida das urbes, abandonando de facto, este modo de administrar as relações humanas que foi provocando no tempo, a atual divisão, tanto no temporal, como no espacial, sobre a vida nas cidades e achegarmos a umas cidades de cada vez mais semelhantes a «gulags».